Ele me olha e avisa que vai me pintar. Os olhos, febris, analisam os meus ossos. Eu anuncio que minha carne se lê com as mãos, e sorrio. Penso em Egon, que ele, claro, não conhece. Morrerá aos vinte e oito anos?
Quero lhe falar sobre Schiele, e me cubro, já assumindo ares didáticos. Desnuda! Ele me ordena, e se assusta. Desnuda? Seja. Emudeço.
Ele abre as janelas e ajoelha-se ao lado da cama, misturando cores. As mãos, tintas de azuis e vermelhos, se mudam para o meu corpo. Na tela de nácar se nomeia o meu silêncio: caminhos-dentro que não percorri.
Suas mãos nomearão o que se abriga em minhas entranhas? Meu corpo tocado tocante tocata vai se cumprindo a cada pincelada desferida por seus dedos. Egon, eu te batizo. Ele me enterra as unhas nas coxas.
Foi assim que eu descobri que ele me possuía. A mim, que desejei metabolizá-lo como a coisa viva que era; fazê-lo meu semelhante, coisa de carne e sangue da qual eu podia me apropriar. Ah, que longa a jornada antes desse lúcido momento! De repente percebo que, sim, estará morto aos vinte e oito anos.
Sandra B.
*divagação ficcional em torno do artista Egon Schiele, um dos mais inquietantes expressionistas.
* imagem: "Embrace Lovers"
10 comentários:
Pode parecer um exagero da minha parte mas li esse texto, e muitos outros, de "queixo caído". É aquela sensação de que não se poderia extrair mais significados dos que você extraiu dessa pintura, algo que é forte e profundo pela percepção desse novo sentido.
Dizer parabéns é pouco. Para mim , é um desafio em sempre ter a sensibilidade de "ler" o mundo com menos obveidade e mais profundidade. Beijos!!!!
sen-ti,re-li,a-mei....lindo devaneio.... com sabor de que-ro-mais....
obrigada, querido, é bom comunicar emoções.
beso
Obrigada, Géh, pela visita e pelo carinho.
Sandrinha,
lindo texto, linda foto, e que ilnda sua página esta,
beijosmil
fica bem,
ana vivas
Belo texto, Sandra.
E belíssima homenagem.
beijo
gracías, Ana.
besito
obrigada, poeta, fico feliz com seu comentário.
gosto dessas "conversas" com artistas que amamos; engraçado, traços dele lembram-me Munch dos inícios...o texto é bom de ler e sensual. Uma coisa de fantasia, embora muito 'corpórea".
Bem bonito, San
besos da El
obrigada, seus comentários são sempre enriquecedores.
besito, amiga
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