sábado, 26 de novembro de 2005

Incomportável


 

seja âmbar

o poema

furtado aos

intestinos da

palavra e

flamante seja

luz  que recende

para sempre

inescrita

 

Sandra B.

 

imagem: Years of fear, 1941. Roberto da Matta. Museu Guggenheim, NY

 

 

domingo, 6 de novembro de 2005

Realidad


Los sueños


que tengo acariciado


si mezclan con


el universo.


Expresiones,


signos,


imágenes


si conjugan entre


las fronteras


del cielo y de la tierra.


No hay división,


sino que uno


punto ciego que


nosotros mismos


construimos y


lo llamamos


realidad.


 


Sandra B.         


 


 


imagem: "Mirando al horizonte" óleo sobre tela de Leonor Maass.    

Moderato Cantabile

Rating:★★★★★
Category:Books
Genre: Literature & Fiction
Author:Marguerite Duras
Marguerite Duras me conquistou com Moderato Cantabile, o livro através do qual tomei contato com sua obra. Eu o li pela primeira vez no final da década de 70 e, recentemente, voltei a ler, agora no idioma original. Esta última leitura, confesso, acabou influenciada pela versão cinematográfica, na qual os protagonistas foram interpretados por Jeanne Moreau e Jean-Paul Belmondo.
Moderato Cantabile se tornou famoso pela proposta narrativa totalmente calcada nos diálogos e reduzindo ao máximo a presença de um narrador, característica da corrente literária “noveau roman”, da qual acredito que Duras seja representante das mais significativas.
O livro aborda um tema recorrente na obra de Duras: o encontro casual e breve, profundamente sensual, entre uma mulher e um homem vindos de mundos incompatíveis, e, portanto, sem possibilidades de permanência, de concretização.
Através das personagens principais Duras explora com talento os contrastes sociais: de um lado, temos a ricaça entediada, que, mais que a si mesma e ao seu desejo, representa um nome - Desbasredes; de outro lado, temos o ex-funcionário do seu marido, agora desempregado, e cujo nome sequer é mencionado no início da história. É um sujeito invisível no universo de Anne.
No seu mundo, Anne Desbaredes exerce um papel, tem uma função, mas não existe verdadeiramente, Anne não É. Mas, no espaço de encontro com Chauvin, ambos passam a existir como uma espécie de entidade da paixão, intocável, inabalável. Aqui cabe lembrar que, na paixão revivemos o “estado narcísico” primal e a conseqüente sensação de plenitude que dele se deriva. Duras utiliza com maestria esse princípio na construção da não-história de Anne e Chauvin.
No livro, M.D. explora, também, o conceito de ‘lugar de pobre, lugar de rico’, e, principalmente, o espaço de confluência: a rua, local onde Anne cruza com Chauvin. O Boulevard de la Mer é a ponte entre dois mundos irreconciliáveis, único espaço não interditado onde poderiam se encontrar. Duras toma esse lugar e o transforma no paraíso viável para que o imaginário floresça e o desejo se imponha sem restrições.
É preciso assinalar, ainda, que Moderato Cantabile é uma pequena obra prima de elaboração da linguagem, e esse é, sem dúvida, o maior atrativo do livro. A linguagem surge e se consolida como um elemento acima do enredo; seduz o leitor e o conduz no difícil caminho de preencher os vazios propositais do texto. Por conta desse detalhe, sou obrigada a discordar daqueles que atribuem a importância da obra ao enfoque social, à análise das relações familiares e outros motivos ‘úteis’. A sua real importância está na forma e não na função.
Recomendo enfaticamente.

Sandra B.

imagem: cartaz original do filme. Disponível em: www.clonagedvd.free.fr

sábado, 5 de novembro de 2005

"Aquilo que ainda pode ser salvo"

Rating:★★★★★
Category:Other
A análise dos vínculos entre Literatura e Sociedade, ou a atribuição de uma função social à Literatura é tema de um sem número de pesquisas. Entre aqueles que defendem que toda obra literária deve obrigatoriamente cumprir um papel social, e a outra corrente de pensamento que entende a obra literária como algo absoluto, que existe em si e por si, não tendo compromisso algum além da estética (estesia), inclino-me a engrossar as fileiras do segundo grupo, sem fanatismos.
Uso a expressão ‘sem fanatismos’, pois, é óbvio que há uma extensa zona de intersecção entre literatura e sociedade; a obra literária (a obra de arte, de modo geral) sofre influência do meio social e o influencia, sendo esse um processo de intervenção dinâmico.
Sempre que tenho oportunidade de participar de seminários que discutem o tema, procuro defender a idéia que o saber gerado pela literatura contribui para a sobrevivência de uma identidade social que se constrói como narrativa; esse saber tece imagens, ora inusitadas, ora familiares, à procura de manifestar o real, que se torna tão mais intenso quanto maior for o estranhamento produzido pelo fato literário.
Não que a obra literária tenha essa responsabilidade ou qualquer outra obrigação (como querem alguns), mas, porque está no seu ‘caráter humano’ já que é produzida por homens.
Quando falo em manifestar o real, refiro-me a determinados ângulos da realidade captados pelo olhar do autor, filtrados pelo seu próprio ideário cultural, sua percepção sensorial e afetiva, e, finalmente, transformados por ele em escritura. Aqui, é preciso cuidado para não ser reducionista: a obra literária não é um mero produto da incorporação de realidades apreendidas ou inventadas.
Através do contato com a escritura de Marcuse tenho compreendido melhor a zona fronteiriça e, portanto, conflitante, entre Literatura e Sociedade. Segundo ele: “A verdade da Arte reside no poder de romper o monopólio da realidade estabelecida (isto é, daqueles que a estabeleceram) para definir aquilo que é real”. As grandes obras da pobremente denominada “literatura de engajamento social”, como “Vidas Secas”, por exemplo, são grandes porque exerceram plenamente esse poder, e não porque cumpriram uma suposta função.
Transpondo o pensamento de Marcuse para esse território, compreendo que a obra de arte literária não se compromete com a questão social, mas, a sua energia estésica pode sim, como quer Marcuse “se tornar uma denúncia [e também] a celebração daquilo que resiste à injustiça e ao terror, e daquilo que pode ainda ser salvo”.


imagem: capa do livro de Marcuse: "Eros and Civilization"