| Rating: | ★★★★★ |
| Category: | Books |
| Genre: | Literature & Fiction |
| Author: | Albert Camus |
Leitura do Absurdo em Camus
Alguns escritores cativam de tal forma nosso imaginário que, ao longo dos anos, retornamos aos seus livros para beber novamente da fonte inesgotável de suas idéias. É o caso de Albert Camus, um dos grandes nomes da literatura universal, nascido na Argélia, na época colônia da França, em 1913.
Antes de completar 30 anos, Camus consagrou-se como escritor com o romance O Estrangeiro, obra de referência do Existencialismo francês; nesse mesmo ano, 1942, lançou o ensaio O Mito de Sísifo, no qual enfoca a questão do absurdo que viria a fundamentar toda sua produção ensaística e ficcional. A grandeza da expressão literária de Camus está relacionada à nítida perfeição estilística do seu texto, à criação de personagens tão bem construídos que sempre nos lembram alguém - nós mesmos.
Ao eleger o absurdo como alicerce de sua escrita, Camus envereda pela alma do homem, percorrendo os atalhos, examinando as encruzilhadas e clareiras, procurando trazer à luz a relação do eu com o mundo em toda sua complexidade , expondo a ânsia desse homem dividido entre fugir à fragilidade da condição humana e tendo consciência da impossibilidade de fazê-lo. Assim: o absurdo nasce deste confronto entre o chamamento humano e o desrazoável silêncio do mundo.
Através de suas personagens, Camus pergunta o tempo todo se a falta de garantias quanto à existência aliada à inexorabilidade da morte retira o sentido ao mundo e, conseqüentemente, à vida de cada um, prevalecendo, somente este caos, este acaso-rei e esta equivalência divina que nasce da anarquia. A descoberta dessa absurdidade explode em Mersault, personagem de O Estrangeiro, que mata um homem porque fazia calor; Mersault, que sentenciado à morte declara: O que me interessa neste momento é fugir à engrenagem, saber se o inevitável pode ter uma saída".
Através de Mersault, Camus nos mostra como o homem possui esse caráter de estrangeiro, estranho no mundo e entre os outros homens que, no fim, são um só; todos empenhados no absurdo esforço de arrastar a pedra para o alto do rochedo, como Sísifo, e sabendo que ela desabará uma vez, e mais outra, e outra. Contudo, esperando, sempre, que o inevitável se torne reversível.
Para esse homem absurdo,que, sem o negar, nada faz pelo eterno; que tem a ousadia de viver no âmbito de seus limites, sem resignar-se ainda que esteja certo da sua liberdade a prazo, da sua revolta sem futuro e da sua consciência mortal a vida merece ser vivida mais e melhor, justamente porque ele concluiu que não há esperança e, assim, entendeu a beleza do agora, do momento presente.
Albert Camus nos diz, através de cada personagem, em cada uma de suas histórias, que o simples fato de estarmos vivos já faz com que a vida valha a pena. Dessa forma, a reflexão que traça ao longo de sua obra sobre o absurdo, o sem-sentido, o suicídio, a solidão e a morte, encaminha-se, gradualmente, para a esperança e a solidariedade humanas (que transbordam no romance A Peste, de 1947) como possíveis soluções do drama do absurdo.
Camus, que ganhou um Nobel de Literatura em 1957, morreu em 1960, num acidente automobilístico. Deixou-nos como herança a sublimidade do seu testemunho de homem: Amo a vida. Eis a minha verdadeira fraqueza. Amo-a tanto, que não tenho nenhuma imaginação para o que não for vida.
Sandra R. S. Baldessin