sábado, 8 de janeiro de 2005

De Pasárgada a Sechiisland – a arte fundando mundos

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Não existem povos sem poesia. A História atesta que, em todas as épocas, em todos os idiomas e dialetos, através de um código de linguagem escrita sofisticado ou da oralidade, a poesia esteve e está presente. Basta nos lembrarmos dos rimadóri da antiga Creta, dos pyitárides, de Chipre, de Bashô, rônin (o ex-samurai) que inventou o haiku (ou hai kai, como é conhecido no Brasil), ou nos lembrarmos da brasileiríssima literatura de cordel.
Oculta sob a poesia, está a figura do poeta – esse ser que mantém um relacionamento tão erótico com a palavra-prima que esta se revela a ele em todas as suas possibilidades. Ninguém É poeta; na verdade, ESTAMOS poetas, condição que prevalece apenas no breve espaço de tempo entre a intuição do poema e a revisão final, após o texto acabado. Quando está poeta, o homem inventa a si mesmo, inventa amores, inventa mundos.
Foi assim que Homero inventou a Grécia para os gregos, que Dante inventou o céu e o inferno, que Manuel Bandeira, um dos mais expressivos poetas brasileiros inventou Pasárgada: “Em Pasárgada tem tudo/ é outra civilização/ tem um processo seguro/ de impedir a concepção /tem telefone automático/ tem alcalóide à vontade/ tem prostitutas bonitas/ para a gente namorar”; por esse mesmo processo, usando palavras como tijolo e argamassa, o artista visual e poeta SECHI, nascido num recanto chamado “Aparecida do Bonito”, mas vivendo em Rio Claro há muitos anos, criou o seu universo (ou multiverso): Sechiisland.
Ilhado em seu mundo, Sechi inventa um dialeto: “das línguas/ todas/ da Terra/ eis da qual/ eu não duvido:/ duas ou três/ gotas de saliva/ sussurradas/ em seu ouvido”.
Sua poesia, volátil, sugere mais o silêncio do que a fala: Já/ que na vida/ nada muda,/ mudo eu.../ silêncio!”A poesia de Sechi busca, na palavra, aquilo que é indizível, como no poema “O Eu-bala-de-amendoim”:
“lá,
lá,
lá...
dançando
entre os seus lá bios
quero derreter
qual bala
de amendoim”

O poema se movimenta, qual o eu-bala na boca da musa, revelando o desejo de fusão, a volúpia do amalgamar-se, dissolver-se no outro. A poesia de Sechi nasce do silêncio, e, quando chega às nossas mãos, traz um aviso do próprio poeta: “leia e jogue fora, ou jogue fora sem ler”. Ou seja, devolva o poema ao seu silêncio primordial.
A Sechiisland é, sobretudo, o endereço do útero desse poeta, o lugar onde nasce a sua arte; há uma filial geograficamente localizável, essa, é apenas a cópia pálida do mundo interior criado pelo poeta. Nessa filial, o artista expõe os seus trabalhos, dedica-se à edição artesanal de seus livros, desenvolve seus projetos de Arte Postal. Como sempre, a arte continua inventando mundos que garantam ao artista o senso de pertencimento.
Se nos guiarmos pela declaração do poeta e ensaísta mexicano, Octavio Paz, segundo quem “o valor de uma obra reside em sua novidade, na invenção de formas ou combinação das antigas de maneira insólita, descoberta de mundos desconhecidos ou de zonas ignoradas nos conhecidos”, compreenderemos que a proposta artística (ou a ausência dela) de Sechi se caracteriza como a mais pura expressão da vanguarda que pode ser vista hoje, em Rio Claro; uma vanguarda que sabe inventar alicerçada na verdadeira tradição. Lendo os poemas de Sechi, observando os seus trabalhos, reconheço: Arte, teu nome é busca!

* Sechi é o idealizador das Edições 100 – sem apoio cultural, sem revisão ortográfica, sem pretensões literárias, sem valor comercial; para adquirir os livros, entre em contato: sechiisland@yahoo.com.br

2 comentários:

Eliana Mora disse...

Muito bom, menina!!!!!!!!

bjs

Sandra Baldessin disse...

obrigada, Eliana. Eu acho importante divulgar o trabalho dos amigos, aqueles que têm qualidade literária.
besito