O filme Asas do Desejo (do original alemão “Der himmel über
Berlin” que, na tradução literal, seria o céu sobre Berlim), dirigido por Wim
Wenders, é um grande clássico do cinema mundial. Uma obra fundamental no
contexto da dramaturgia alemã, eleita pela revista Times como uma das cem
películas mais importantes de todos os tempos. Embora o enredo se atenha ao
período do pós-guerra, engana-se quem julga que o filme é datado, já que se
vincula a um fato histórico delimitado cronologicamente.
O argumento conta a história de dois anjos invisíveis que
sobrevoam continuamente os céus de Berlim, provavelmente desde tempos
imemoriais. Eles olham e analisam o comportamento dos seres humanos: a angústia
e a desesperança de uma cidade dividida por um muro. A função dos anjos é “escutar”
o desejo, os pensamentos, sentimentos e emoções dos berlinenses, que não sabem
que são observados, ou melhor, percepcionados por essas personagens invisíveis.
São pensamentos que expressam profunda solidão e nostalgia, que remetem ao
abandono e a uma solidão quase concreta em sua densidade.
Um dos anjos, Damiel, está profundamente infeliz com sua
condição angélica, por assim dizer, que, embora brindada com a eternidade, é desincorporada
do mundo que ele percebe tão avidamente. Vale lembrar que perceber, percipere, do latim, significa apreender
pelos sentidos, algo impossível para um ser desencarnado.
O tema central do filme é, justamente, o desejo incorpóreo – que
marca toda a história, exprimindo profundamente a incapacidade de representação
do desejo, cuja condição é falta, a invisibilidade. No filme, como na vida,
aparece como algo flutuante.
Quando Damiel se apaixona pela trapezista, Wenders está falando
do infinito desejando o finito, do transcendental aspirando à materialidade, da
eternidade em busca do que é fugaz, da única narrativa possível: a narrativa da
vida de um homem – ser histórico.
Aí reside a mágica e o segredo do filme: as personagens de As asas
do desejo dizem de nós, do que somos
como seres históricos; nossa vida é uma narração, estamos nos escrevendo à
beira de um passado de mentiras (a história contada pelos vencedores), um
presente que surge como a Berlim do pós-guerra, em ruínas, e um futuro que não
se encarna nunca.
Hoje, além dos anjos, o muro também é invisível, mas tremendo em
sua realidade desincorporada, indestrutível.
Asas do desejo, vale a pena ver, rever, rever, rever...
Um comentário:
Um dos meus preferidos , junto a Tão longe, tão perto, se completam, gostei de ler sua resenha..
Beijos
Malmal
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